Dia Internacional da Mulher 2016: O que celebramos?

Dia Internacional da Mulher 2016 um momento de celebramos as lutas e conquistas da mulher muito além de demonstrações de carinho e gentilezas.

Afinal, hoje a maioria dos homens se convertem em receptáculos de amor e doçura para parabenizar e saudar e exaltar e dar flores e fazer posts no facebook para todas as mulheres que conhecem.

Mas a dura realidade da nossa sociedade mundial é que o dia de hoje é um dia muito triste para as mulheres e a partir de amanhã, dia 09 de março, elas voltam a uma dura realidade muito diferente de todas as juras de amor feitas no dia de hoje.

Você pode achar que eu estou exagerando, mas vamos extrapolar nosso microcosmo diário e analisar a situação da mulher em alguns lugares do mundo. Existem países onde as mulheres são meros objetos, cuja posse pertence ao pai ou ao marido, sem exceções.

Tomemos o caso da Arábia Saudita por exemplo, onde o regime islâmico wahabita, ultraconservador nega direitos básicos às mulheres, como por exemplo não podem dirigir automóveis, não podem falar com outros homens que não sejam de sua família, não podem viajar sem um guardião, não podem ser examinadas por um médico sem um guardião.

São obrigadas a cobrirem inteiramente seus corpos quando saem de casa, queiram ou não queiram. Só nas últimas eleições as mulheres puderem votar e serem votadas para cargos eletivos, porém na campanha foram proibidas de discursarem para os homens. Se eleitas não poderiam sequer conversar com os outros eleitos do sexo masculino.

Então, imagine como seria o Dia Internacional da Mulher 2016 ideal para essas mulheres?

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E, por incrível que pareça, expressiva parte das mulheres sauditas são favoráveis a isso tudo, concordam com essa interpretação mais fundamentalista da lei islâmica e vivem satisfeitas, entendendo que o feminismo é uma invenção ocidental. Coitada de você se viver por lá e não concordar com tudo isso.

Mas talvez a posição da Arábia Saudita seja muito extrema, em um levantamento do Fórum Econômico Mundial de 2015, ela ocupava a 134ª posição entre 145 países pesquisados, sobre desigualdade de gênero, ou seja, existem só 11 países piores que ela, 6 localizados no Oriente Médio, 4 na África e 1 na Ásia.

Sendo um pouco justo com a Arábia Saudita, pelo menos lá há uma proteção institucional estatal às mulheres, apesar de proibir e negar muitos direitos. A situação é muito diferente em outros países, a questão vai muito além da simples desigualdade de gênero.

Em muitas partes do mundo mulheres não dispõem de direitos básicos relativos à sua vida e segurança pessoal. Na Índia por exemplo ainda são comuns os casos de estupros coletivos de mulheres em cidades grandes. Que dirá em localidades remotas. Os casos só agora começam a ser levados à justiça, por pura pressão social, e muitas vezes as vítimas são marcadas como impuras ou prejudicadas e excluídas da vida social. Na verdade, muitas vezes a própria vítima se considera impura, ocorrendo a inversão total de valores humanos básicos.

Em uma grande quantidade de países, como Nigéria, Guiné, Sudão, Mali, ainda hoje as mulheres são submetidas à mutilação genital feminina, com o corte do clitóris e prepúcio clitoriano. Isso faz com que as mulheres simplesmente não tenham mais capacidade de sentir prazer e é um costume tradicional que denota uma suposta castidade e pureza feminina. Em muitas localidades a mulher que não for mutilada não consegue casar.

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Apesar do esforço de alguns países e das Nações Unidas que considera a prática uma grave violação de direitos humanos e uma forma de tortura, a prática ainda é comum e realizada e apoiada pelas mães e avós das vítimas. São países onde as leis importam muito pouco, o que vale são os costumes, são os conselhos tribais, são as tradições seculares que não se modificaram apesar do passar dos milênios.

Esses costumes se baseiam no conceito cultural de subjugação das mulheres pela força. Aliás na história da humanidade, a força física sempre foi, e em grande medida ainda é, o elemento definidor da conduta. Impõe quem tem força, chora quem não tem. Só muito recentemente e com muito pensamento e esforço o mundo desenvolveu o conceito de defesa institucional da vida, dos direitos humanos básicos, mas é com muita lentidão que essa defesa é implementada. Nem se precisa dizer que essa defesa é na maioria das vezes ainda falha, especialmente em rincões sociais remotos, onde simplesmente não há polícia ou tribunais para defenderem os direitos das mulheres.

Mas não vamos pensar que a situação das mulheres é grave só nesses países onde não há segurança de direitos humanos básicos. Muito pelo contrário. Em muitos países desenvolvidos onde há direitos assegurados às mulheres, há o preconceito, há o machismo, há a misoginia a tolher o direito das mulheres.

Segundo dados divulgados na semana passada, no Brasil as mulheres ainda ganham 70% do que os homens ganham para executar a mesma tarefa ou função. E segundo os cálculos, seriam necessários mais 70 anos para que essa diferença chegasse a zero. Em outras palavras, demoraríamos 70 anos para reconhecer financeiramente que o trabalho da mulher vale o mesmo que o trabalho do homem. O Brasil, apesar de ter uma presidente mulher, ocupa a 85ª posição no ranking de desigualdade de gênero, e a posição no ranking vem piorando a cada ano que passa.

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Ainda hoje no Brasil não se consegue dar segurança básicas às mulheres. Diariamente mulheres são agredidas, desrespeitadas, mortas. Só no Estado de São Paulo a Justiça concede nada menos que 12 medidas liminares POR DIA, proibindo seus maridos, namorados, etc, de chegarem perto de suas mulheres. Existem mais de 70 mil processos judiciais no Estado de São Paulo, envolvendo agressões físicas, psicológicas ou financeiras de homens contra mulheres, especificamente mulheres de sua própria família.

E os levantamentos nacionais não são melhores. Segundo eles, 38,72% das mulheres do Brasil sofrem agressões DIÁRIAS em razão de sua condição de mulher. Desse total, 85,85% das agressões são de natureza doméstica e familiar e em 67,36% as agressões são realizadas por homens com quem as mulheres já tiveram relacionamento afetivo. O amor machuca. Literalmente. Mais da metade dos homicídios de mulheres são feitos por familiares, 33% por parceiros e ex-parceiros. O amor mata. Literalmente. Mais do que você imagina.

Essa cultura vem do conceito assimilado por uma grande parcela da população que ainda acredita haver um direito de posse dos homens sobre as mulheres. Conceito esse reforçado pelo machismo diário cotidiano, presente nas mentes masculinas e também femininas, que agem cerceando direitos, impondo limites, condenando condutas. Machismo presente em frases e conceitos bobos como “isso é coisa de mulher”, até em frases e pensamentos ignorantes como “foi estuprada porque vestiu roupa curta”.

Fora sem falar em limitações, violências e exclusões impostas às mulheres por questões religiosas ditadas por líderes religiosos de maioria masculina.

Sem falar também nos casos onde não há violência, mas simplesmente se “entende” que as mulheres, além de trabalhar, devem cuidar da casa, dos filhos, do marido, tem que cozinhar, lavar, passar, fazer supermercado, lição de casa e ainda estar bonita, cheirosa e libidinosa pro marido, senão ele vai lhe botar um par de chifres. Na realidade, para a esmagadora maioria das mulheres das sociedades ocidentais não há igualdade nenhuma no dia-a-dia e seus direitos vêm junto com um custo gigantesco do qual os homens não estão muito dispostos a discutir ou compartilhar…

A verdade nua e crua é que o ocidente se esmera em fazer legislação protetiva às mulheres, mas peca profundamente em executar essas leis e modificar seu pensamento diário nocivo e agressivos a essas mesmas mulheres no seu dia-a-dia.

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Seria muito importante que os homens, e também todas as mulheres, não só no dia de hoje, mas em todos os dias pudessem refletir profundamente sobre o que temos que fazer para realmente mudar e melhorar a realidade concreta das mulheres à nossa volta, garantindo direitos, mas também garantindo efetividade a eles. Garantindo segurança contra as violências, cidadania plena e um verdadeiro lugar ao sol.

Usar, inclusive o Dia Internacional da Mulher 2016 para garantir também o fim do machismo, da misoginia, da discriminação velada. Garantindo às mulheres o direito de existirem, respirarem e viverem sem o medo diário só pelo fato de serem mulheres. Garantindo um dia-a-dia digno e não exaustivo.

E nós gays, que integramos uma minoria mundialmente oprimida, deveríamos ser os primeiros a defender tudo isso, pois como diz a campanha contra a homofobia, quando um não tem direito, ninguém tem direito.

As nossas mulheres merecem muito mais do que um dia só de homenagens e cumprimentos falsos e vazios, elas merecem nosso respeito enquanto seres humanos, merecem nossos cumprimentos e saudações enquanto guerreiras e lutadoras ardorosas, merecem nossa compaixão enquanto sofredoras silenciosas e escondidas e especialmente merecem nosso amor incondicional enquanto seres humanos fantásticos!

Brindemos, respeitemos e enchamos de amor todas as mulheres no dia de hoje, mas vamos fazer mais por elas nos demais dias do ano.

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