Homem afeminado: Valores acima de expectativas alheias

Homem afeminado é entendido como o homem cisgênero ou transgênero que apresenta trejeitos ditos femininos.

Recentemente, durante um jantar, uma conhecida se referiu a mim como um homem “feminino demais” por eu ser gay.

Como a observação me causou certo desconforto, decidi refletir um pouco sobre o que isso significava para mim e para a sociedade que me rodeia.

O primeiro ponto que me veio a mente foi como esse rótulo é carregado de emoções e sentimentos negativos, ou seja, como ele é usado de uma forma pejorativa, como ofensa.

Contudo, pensando mais cuidadosamente, observei o quanto meus valores pessoais estão atreladas ao universo dito feminino, ou seja, boa parte do que eu considero como algo relevante e importante para nossa sociedade figura relacionado com esse universo.

Delicadeza, carinho, acolhimento e conseguir o que se quer com calma, respeitando as pessoas e os sentimentos à nossa volta permeiam mais o imaginário construído sobre o feminino do que sobre o masculino.

Enquanto isso o masculino figura nesse contexto como algo relacionado a virilidade, agressividade, violência, egocentrismo, egoísmo e liberdades excessivas. Tais valores realmente não conversam comigo.

Mas, então, se o feminino diz mais sobre o que eu acredito e é a maneira como quero interagir com o mundo, por que a referência me causou desconforto?

Refletindo mais sobre esse termo, percebi uma relação dele com uma construção de feminino como algo fraco, frágil e “mole”.

É como se fosse o feminino fosse incapaz de fazer as coisas sozinho, dependendo de um ser masculino (másculo), que é livre, independente, viril e corajoso para realizar coisas no mundo.

Mas será mesmo que todo “ser” feminino precisa de um “ser” masculino para realizar coisas no mundo? Será realmente que nós, seres mais femininos, somos frágeis, fracos ou moles?

A resposta que me veio foi um óbvio não.

Eu posso dizer que sofro e sofri mais preconceito por ser um homem cisgenêro com trejeitos femininos, mas isso não me fez mais fraco, ao contrário, precisei ser mais forte para enfrentar as muitas lutas que um homem com supostos trejeitos masculinos nem imagina como é, seja ele homossexual ou heterossexual.

E não caia na falácia de que todo homem afeminado é homossexual e todo homem masculinizado é heterossexual, pois isso não é verdade.

O contrário existe muito mais do que podemos supor na nossa defeituosa tendência de ver mundo como algo binário.

Homem afeminado: Mais uma das nossas caixinhas limitantes

A questão é que a vida não é composta de sim e não, verdade ou mentira, preto e branco, 1 e 2.

A vida vem em cores múltiplas, características variadas, escalas de cinza, muitos “talvez” e constantes mudanças.

Seria mais fácil viver em um mundo de respostas definidas, mas isso não é mais possível e (quem sabe um dia) será inaceitável.

Ser um homem afeminado deve ser um orgulho para mim, primeiro como respeito a belíssima carga que essa construção carrega. Segundo por que minhas características, sejam quais forem, dizem respeito a mim e como eu interajo no mundo, e não estão a serviço dos desejos e anseios alheios.

Não acredito que devamos agradar as expectativas dos outros em relação a como devemos agir, seja por causa da nossa sexualidade, da nossa religião, da nossa cultura limitante ou da nossa genitália.

Derrubar as caixinhas é primordial para um mundo melhor. E um mundo melhor, na minha visão, é feminino e respeita todas as diferentes formas de sermos e existirmos.

Por isso, inclusive, que celebramos o orgulho gay.

Em oposição direta a vergonha que alguns tentam nos fazer sentir pelo que somos, nos levantamos com orgulho das nossas construções fora dos padrões limitantes estipulados.

Descobri então que tenho orgulho de ser um homem afeminado, afinal meus valores são femininos. Contudo isso não me faz fraco, frágil ou mole, e definitivamente não é isso que me faz um homem gay e nem o contrário.

O que me faz gay é eu ser um homem que sente atração sexual e amorosa por alguns outros homens gays. Todo o resto são só traços que compõe um multifacetado eu.

Me colocar em caixinha por causa de um único recorte de mim é pura violência. Uma violência que, se fosse em direção oposta, provocaria choro, lágrimas e revoltas.

Mas ser um homem afeminado me ensinou a ser calmo, pensar sobre os meus sentimentos e me tornar mais forte diante dos muitos desafios e preconceitos que aparecem cotidianamente na minha vida.

Afinal eu sou uma Fanta sim, e com muito orgulho!

Referências

Capa: Adam Lambert;

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